sábado, 10 de maio de 2008

O país da delicadeza perdida


No dia 29 de março, a menina Isabella Nardoni, de 5 anos, fora asfixiada e arremessada do 6º andar do apartamento do seu pai, Alexandre Nardoni, e da sua madrasta, Anna Carolina Jatobá. As especulações em torno do caso ganham diferentes matizes em diversos âmbitos da sociedade. No entanto, após um mês do assassinato, o caso parece estar longe de um desfecho. Nesse momento, de comoção nacional, nossas deficiências tornam-se mais nítidas, tanto no que diz respeito às estruturas jurídica, política e social, quanto no desenvolvimento de nossa cidadania.

Nos últimos anos, as tragédias brasileiras (como a do menino João Helio) têm adquirido um caráter “clichêrizado”, como se houvesse uma seqüência premeditada: 1º - morte trágica; 2º - circo midiático; 3º - indignação seguida de um excesso de fúria; 4º - confecções de camisas, “shows” e missa de 7º dia, com cobertura da mídia e 5º - amnésia, seguida de retardamento. Neste quadro surrealista, encaixa-se a perícia do caso Isabella e a nossa Constituição. A primeira, mesmo com um enorme aparato tecnológico, mostrou-se ineficaz: por que, logo após o assassinato, o apartamento não fora lacrado? Não sei. Quanto à segunda, é evidente a caduquice da legislação brasileira.

As feridas expostas mostram-nos, também, o modelo jornalístico escolhido pelos meios de comunicação. Nas bancas, jornais e revistas noticiam o caso diariamente como em um antigo folhetim, manchetes fazem o seu próprio julgamento: "Foram Eles" (capa da revista Veja – 23/04/08). Isso sem falar no frenesi da tevê brasileira, na busca do exclusivo, do grande furo. Entre articulistas e colunistas surgem novos “opinadores” na imprensa brasileira. O jornalista Artur Xexéu, por exemplo, em sua coluna no jornal O Globo, mostrou-se perplexo diante dos fatos, mas manteve a imparcialidade diante da morte da menina de 5 anos. O cineasta, crítico e colunista Arnaldo Jabor, no entanto, usou o espaço (coluna) para praticar o mesmo julgamento dos demais meios de comunicação.

De fato, a falência múltipla dos órgãos acomete todo o Brasil. Na falta de análises críticas e profundas, vivemos na lógica do absurdo. Neste caso, nem a imparcialidade do Xexéu, nem o julgamento do Jabor contribuíram para a saúde nacional. Nosso Jornalismo banha-se na superficialidade dos trópicos. A inércia brasileira não permite que a sociedade olhe para o passado; mas está longe de uma projeção voltada para o futuro. Perdemos a percepção, a delicadeza. Continuamos apáticos. E, enquanto assim estivermos, somos culpados.

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