sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

A Morte e nós, reles mortais

Assim como o início ou princípio de todas as coisas, os filósofos também tentaram desvendar a grande esfinge da História da civilização: a morte. Se nós, reles mortais, não somos deuses, findamos um dia. Estamos à mercê da vontade do deus Thanatos. Mas, se tudo é passageiro, então qual é o verdadeiro sentido da vida? Segundo o cristianismo, a vida terrestre é uma fase pela qual temos que passar antes de chegarmos ao paraíso prometido. Este é um bom consolo para os espíritos impassíveis. Contudo, a inquietude, a “admiração” e o “espanto” (aquilo que os gregos denominaram thauma) sempre habitaram a mente dos grandes pensadores.

Para o filósofo alemão Friedrich Nietzsche, a vida, apesar do caráter mutável dos fenômenos, é indestrutívelmente poderosa e cheia de alegria. Por outro lado, Heidegger, estudioso das concepções nietzschianas, acredita que “o sentimento de angústia ou de medo profundo, situação na qual se antecipa a possibilidade da morte, é uma das ocasiões em que se oferece a oportunidade de se romper com o jeito impessoal de se viver no mundo”. No filme O Sétimo Selo (1957), de Ingmar Bergman, o protagonista desafia a morte para uma partida de xadrez. Mas, mesmo vencendo o embate, ela continua a persegui-lo.

O cantor Gilberto Gil compôs, em seu mais recente disco, Banda Larga Cordel, uma canção chamada Não Tenho Medo da Morte. Na segunda estrofe, numa tentativa de compreender ou adquirir a autoconsciência (principal finalidade da dialética socrática) e, conseqüentemente, fugir da contemplação, ele reitera o que havia dito na primeira: “A morte já é depois/ Já não haverá ninguém/ Como eu aqui agora/ Pensando sobre o além/ Já não haverá o além/ O além já será então/ Não terei pé nem cabeça/ Nem fígado, nem pulmão/ Como poderei ter medo/ Se não terei coração?".

Algo semelhante fora dito pelo filósofo grego Epicuro (341-270 a.C): “A morte não é nada que diga respeito a nós”. Diferentemente da vida que permite, além de analisá-la, presenciar o “ato de viver” – a redundância é proposital -, na morte somente o “ato de morrer” do outro nos é permitido.

A morte, fomentadora da intempérie e guardiã do sofrimento, nós tememos. No entanto, é ela quem nos desnuda e nos mostra que, diante de sua soberania, somos todos iguais, de carne e osso. Durante a vida vivemos em conflitos internos e externos, sucumbimos e damos importâncias a algumas mesquinharias e, talvez pelos olhos estarem embotados de imagens insossas, CO2 e dogmatismos, não enxergamos o horizonte que existe para além de nós mesmos. Se Sócrates aqui estivesse, provavelmente diria: “Oh, pobres mortais, por que acreditam que tudo sabem quando nada sabem?”.

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